Os cuidados pastorais a ter com
divorciados e recasados, homossexuais e outros casos de uniões irregulares e a promoção
de alterações nos processos de nulidade matrimonial foram os tópicos mais em
discussão na tarde de ontem e na manhã de hoje. O excesso de intervenções
pedidas pelos bispos sinodais levou a que o tema de ontem se estendesse até
parte da manhã de hoje, provocando atrasos na discussão do tema previsto para
esta manhã, que será apenas concluído da parte da tarde.
A discussão foi «acesa» e «apaixonante»,
«com todas as cartas na mesa», explicou o Pe. Thomas Rosica, um dos porta-vozes
que fazem o resumo diário aos jornalistas, mas sempre envolto num «clima de
respeito» por todas as intervenções. O Cardeal Francesco Coccopalmerio, presidente
do Conselho Pontifício para os Textos Legislativos, foi um dos bispos presentes
hoje no briefing, e o mais requisitado pelos jornalistas presentes.
No tópico do acolhimento aos
divorciados recasados, o Cardeal Coccopalmerio demonstrou a abertura que se tem
vivido no sínodo com uma postura aberta ao acolhimento destas pessoas. «Pensem numa mulher que se casou com um homem abandonado injustamente
pela sua esposa, com três crianças pequenas. Esta mulher uniu-se a ele, criou
as três crianças, deu-lhe a vida e agora dizemos-lhe: “abandona esta união,
senão não te damos a Comunhão” O que devo fazer nessa
altura?», questionou, sem no entanto esclarecer se concordava que essa pessoa
deveria receber os sacramentos que, segundo a lei canónica atual, lhe são
negados.
O cardeal italiano afirma que
«devemos adotar a hermenêutica do Papa, que é a de guardar a doutrina, mas
partir da pessoa individual, do seu sofrimento, e dar uma resposta individual
às pessoas concretas que se encontram em situações de gravidade e urgência».
Por isso, defende alterações que podem ser muito significativas nos processos
de nulidade, nomeadamente no que diz respeito ao envolvimento do bispo
diocesano no processo. «Se o defensor é uma pessoa credível, eu bispo, posso
declarar que o matrimónio é nulo. E em alguns casos isto poderia tornar o
processo mais rápido. Apenas o testemunho de um ou dois dos contraentes - sem
prova testemunhal, documental, apenas a palavra. Neste caso, se são “credíveis”,
eu bispo desta diocese, posso declarar que este matrimónio é nulo», sustentou o
prelado, acrescentando que, «em certos casos, é verdadeiramente importante», que
este procedimento avance.
Quanto à questão dos ortodoxos, o
Cardeal Coccopalmerio confirma que a questão foi abordada na aula sinodal
durante as intervenções, e aceita que se estude e hipótese, mas não está
convencido do sucesso dessa abordagem. «Só o primeiro matrimónio ortodoxo é o
verdadeiro matrimónio. As outras uniões não são matrimónios, são uniões
acompanhadas, bentas, mas não são matrimónios para os ortodoxos. O Sínodo tomou
em consideração esta hipótese, e veremos. Creio que o assunto pode ser colocado
a estudo nos círculos menores, mas para mim é difícil que se faça isto com sucesso»,
considerou.
Foram ainda lançadas pelos bispos
outras possibilidades de agilizar os processos de nulidade, como a exclusão de
uma segunda sentença, a existência da figura do defensor do vínculo, uma maior
divulgação desta possibilidade aos fiéis. Tudo olhando na necessidade de
encarar cada caso como um caso, sem soluções que sirvam para toda a gente. «O
que está a acontecer no Sínodo é que temos uma forma de reflexão indutiva,
baseada na experiência das pessoas, que é uma fonte teológica. Estamos a aprender
a usar o estudo de caso, ao refletir teologicamente sobre os casos das pessoas.
Aprender a fazer isto vai levar tempo, e muitas vozes dizem que não há nenhuma
linha que será aplicável a todos os indivíduos», sustentou D. Paul-André
Durocher, presidente da Conferência Episcopal do Canadá, o outro convidado no
briefing desta manhã.
Impedir «matrimónios turísticos»
Durante as intervenções no
sínodo, um dos aspetos mais focados foi a preparação para o matrimónio. O Pe.
Dorantes, outro dos porta-vozes, falou da intervenção de um bispo que falou da
existência de «matrimónios turísticos», um fenómeno que tinha na sua diocese,
onde havia uma igreja que, pela sua beleza, recebia noivos de todo o mundo. «Os
sacerdotes que prestavam serviço lá estavam tão desanimados que não faziam
qualquer tipo de trabalho pastoral com os noivos, limitavam-se a pedir que os
papéis viessem todos em ordem, e nada mais, e os próprios novos encaravam a celebração
como mais uma paragem no périplo turístico por aquele país. Acabei por proibir
que se realizassem lá essas celebrações, e sugiro que todos os bispos façam o
mesmo nas suas dioceses», disse o bispo na sua intervenção.
Este exemplo veio no seguimento
de muitos outros padres que, segundo o Pe. Rosica, falaram na necessidade de
aprofundar a preparação para o matrimónio, para que este possa ser «apresentado
aos jovens desta nova geração de uma forma que seja apelativa para eles», sem
perder a exigência necessária.
O Pe. Rosica falou ainda que,
apesar de «muitos pretenderem respostas imediatas», «o que foi pedido foram estratégias
pastorais a médio e longo prazo, num esforço comum que permita evitar o
desmoronar dos valores».
Sobre a questão do acolhimento
aos homossexuais, ficou claro para o Pe. Rosica que o sínodo pretende que haja
«um cuidado pastoral em relação aos homossexuais». «Não se trata de fazer
analogia entre casamentos, mas, ao fazer a distinção, respeitar a humanidade de
cada pessoa e tratá-los com respeito e compaixão», disse o sacerdote.
O Cardeal Francesco Coccopalmerio
acrescentou que é preciso que essa distinção fique clara. «Não rejeitamos os
casais homossexuais, mas dizer que abençoamos esse tipo de união, por uma
questão de lógica, não podemos dizer, pois não faz parte do nosso modo de ver a
doutrina cristã», referiu o prelado.
Texto: Ricardo Perna
Fotos: News.va e l'Osservatore Romano
0 comentários:
Enviar um comentário