Evangelizar pais e filhos é um
desafio que se coloca hoje à Igreja. O próprio Sínodo para a Família aborda
essas questões da necessidade de acompanhamento das famílias, e é nesse âmbito
que surge a catequese familiar, que vem revolucionar o conceito de catequese de
infância ao incluir os pais no processo catequético. O projeto começou há três
anos e a FAMÍLIA CRISTÃ foi conhecer os frutos que já existem.
Há três anos, um grupo de
paróquias-piloto iniciou um projeto pioneiro de catequese familiar em Portugal.
Uma iniciativa que surgiu na América Latina, no Chile, que se propagou por todo
o continente e chegou à Europa. A catequese familiar surgiu em Portugal pela
mão do Pe. Vasco Gonçalves, de Viana do Castelo, que sugeriu a introdução desta
nova forma de compreender a catequese de infância como resposta à falta de
cultura religiosa que grassa pelo país e pelas paróquias.
Inicialmente pensado para
acompanhar as famílias até à Primeira Comunhão dos filhos, o projeto chegou,
neste final de ano pastoral, ao fim do seu primeiro ciclo, com a celebração da
Primeira Comunhão, e o Pe. Vasco Gonçalves declara-se muito «satisfeito» com o
resultado. «Estou mais que satisfeito. Eu estava convencido que o projeto iria
funcionar, por causa dos frutos que já tinha observado nos países em que já
existia», explica o sacerdote, que adianta que este projeto permitiu trabalhar
a «centralidade da Eucaristia» dentro das famílias.
Cristina Sá Carvalho, diretora do
departamento de catequese do SNEC (Secretariado Nacional da Educação Cristã),
órgão que abraçou este projeto desde o início, faz um balanço semelhante. «Do
ponto de vista dos resultados, penso que foi muito positivo e começou logo a
sê-lo», diz esta responsável, que adianta que as taxas de desistência dos pais
que iniciaram o projeto foi extremamente baixa. «Quase não houve desistências
nos grupos das paróquias-piloto durante os três anos, e aquilo que era a
vivência e a experiência deles também começou logo a ser muito positiva desde o
início. Os pais perceberam que era muito valioso para a sua vida familiar», diz
a diretora do SNEC.
A catequese familiar segue os
mesmos guias e conteúdos que a catequese “normal” das paróquias, pelo que as
grandes mudanças que este projeto traz não são ao nível dos conteúdos, mas sim
da vivência e da motivação. «A catequese familiar permite uma maior vivência da
fé em família. Nós propomos poucas coisas para a família fazer, mas essas
pequenas coisas permitem desenvolver essa vivência. Depois há o maior
envolvimento da família toda na vida da comunidade», diz o Pe. Vasco. Cristina
Sá Carvalho concorda, e acrescenta a questão da «evangelização mútua» de pais e
filhos. «Há uma vivência de globalidade da experiência de fé que é muito forte,
que origina uma evangelização mútua entre pais e filhos. Nestas famílias, o
Espírito sopra com muita força», considera esta responsável.
O reforço dessa relação familiar
foi uma das coisas que o André e a Ana, pais que participaram no projeto na
diocese de Viana do Castelo, sentiram na sua relação com o Tiago, o filho que
fez há pouco tempo a sua Primeira Comunhão. «Ao início foi um choque. “O quê,
agora termos de voltar para a catequese? Para quê?”, comentávamos nós, mas
depois foi um crescer muito giro, entre o grupo de pais e entre nós e o Tiago,
porque eu e o André já tínhamos uma forma de comunicar a nossa fé entre nós,
mas com o nosso filho não havia, e isto ajudou-nos imenso», diz esta mãe, que
revela que o próprio filho se tornou exigente para com eles. «Há pouco tempo
disse-nos que se não o levarmos à Missa a comungar, que nós é que ficamos em
pecado, porque ele é apenas uma criança», conta, entre risos.
Da esquerda para a direita: o Pe. Vasco Gonçalves, Pedro Ruivo e a família André, Ana e o filho Tiago |
O pai André fala em maior
motivação. «Quando eu andava na catequese, uns anos era por prazer, mas outros
por obrigação, dependia do catequista. Mas este projeto ajudou-nos a sermos
exemplo, e sabemos que se formos exemplo quem vem atrás tem sempre mais
motivação para agir. Se os pais forem à catequese, os filhos também se vão
motivar para ir», considera.
Como resultado desta maior motivação,
ganhou também a comunidade e o resto do grupo de catequese dos pais que não
aderiram à catequese familiar. «Os nossos convívios de final de ano da
catequese são históricos, juntam imensa gente, e tal só é possível porque a
iniciativa parte do grupo dos pais da catequese familiar, que depois abrem o
convite a todos os pais e crianças», explica André Esteves.
Parte deste mérito está nos
animadores familiares, os catequistas que asseguram a formação dos pais. Pedro
Ruivo, de 43 anos, já tinha sido catequista de adolescentes, mas estava meio
afastado. Até que a filha mais nova entrou para a catequese há três anos e o
pároco o convidou a fazer parte do projeto de catequese familiar, não só como
pai, mas como animador familiar. «É totalmente diferente de ser catequista de
adolescentes, isso é certo», afirma, explicando que «são pais, têm alguma
experiência, colocam outras questões. Era uma novidade, mas os pais já tinham
algum caminho feito, pelo menos a maioria, embora os que andavam mais afastados
tenham sido belas surpresas.»
Os encontros dos pais eram
quinzenais, e pontualmente havia encontros entre o grupo dos pais e o grupo de
catequese das crianças. Mas são muitas as possibilidades de organizar este
projeto, e por isso o SNEC não limita as paróquias, antes acompanha-as no
modelo que cada paróquia define, dentro das várias propostas existentes.
O ponto alto destes três anos
foi, claro, a festa da Primeira Comunhão, que marcou o final desta caminhada
que estava projetada para três anos. «A Primeira Comunhão foi um momento muito
especial, e os pais tomaram consciência da importância desta celebração em
virtude do trabalho que foi sendo feito durante estes três anos», argumenta
Pedro Ruivo.
O trabalho feito com os pais foi
tal que os pais se entusiasmaram e tomaram parte ativa na preparação da festa
dos filhos. «Os pais viveram por dentro a preparação em si da cerimónia. O
grupo coral foi substituído pelos pais, que animaram a celebração, todos
participaram e viram o porquê das coisas, e foi um sabor diferente que teve
esta comunhão, porque foi preparada por todos», recorda o animador familiar.
Apesar de funcionar apenas para
os três primeiros anos de catequese, o SNEC decidiu avançar com mais três anos,
até ao 6.º volume de catequese. Foi um pedido dos pais que veio confirmar uma
intuição de Cristina Sá Carvalho. «Já tinha esta ideia desde o princípio. Nas
paróquias-piloto os pais disseram logo que queriam acompanhar até ao fim, ou
seja, os 6 anos», afirma.
Os bons resultados levam este
jornalista a colocar a pergunta óbvia: Poderá a catequese familiar substituir
por completo a catequese de infância a que estamos habituados? Enquanto
Cristina Sá Carvalho tem algumas preocupações com o assunto, o Pe. Vasco não
tem grandes dúvidas que sim. «A meu ver, o grande objetivo é que os três
primeiros anos sejam de catequese familiar em todo o lado. É uma altura em que
os pais acompanham de perto os filhos e é a grande oportunidade de
evangelização dos pais», considera. A diretora do departamento de catequese do
SNEC defende que deve haver uma complementaridade, até porque alguns pais, pelo
menos numa fase inicial, «não aceitarão integrar os projetos». Nas paróquias
que assumem por completo a catequese familiar, esses pais são dirigidos para
paróquias vizinhas que não têm esse projeto, mas o Pe. Vasco acredita que, com
o tempo, todas as paróquias passarão a ter estes projetos e eles serão tão
naturais que todos os pais irão aderir, à semelhança do que sucede já no Chile,
por exemplo.
Outro problema é o dos catequistas.
Além de haver falta de catequistas para a catequese “normal” em algumas das
grandes dioceses, esta necessidade de recrutamento é ainda mais específica,
porque compreende o trabalho com adultos. Mas Cristina Sá Carvalho acredita
que, com o aumento dos grupos de catequese familiar, irá aumentar também o
campo de recrutamento de catequistas e outros agentes pastorais para as
paróquias, pelo que o tempo é de avançar e trilhar caminho, e não de ficar com
receio de perder esta ou aquela família em virtude de pais que demonstram menos
interesse na educação cristã do seu filho.
Ricardo Perna
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