29 de setembro de 2014

Catequese familiar - O futuro da catequese infantil?



Evangelizar pais e filhos é um desafio que se coloca hoje à Igreja. O próprio Sínodo para a Família aborda essas questões da necessidade de acompanhamento das famílias, e é nesse âmbito que surge a catequese familiar, que vem revolucionar o conceito de catequese de infância ao incluir os pais no processo catequético. O projeto começou há três anos e a FAMÍLIA CRISTÃ foi conhecer os frutos que já existem.
 
Há três anos, um grupo de paróquias-piloto iniciou um projeto pioneiro de catequese familiar em Portugal. Uma iniciativa que surgiu na América Latina, no Chile, que se propagou por todo o continente e chegou à Europa. A catequese familiar surgiu em Portugal pela mão do Pe. Vasco Gonçalves, de Viana do Castelo, que sugeriu a introdução desta nova forma de compreender a catequese de infância como resposta à falta de cultura religiosa que grassa pelo país e pelas paróquias.
Inicialmente pensado para acompanhar as famílias até à Primeira Comunhão dos filhos, o projeto chegou, neste final de ano pastoral, ao fim do seu primeiro ciclo, com a celebração da Primeira Comunhão, e o Pe. Vasco Gonçalves declara-se muito «satisfeito» com o resultado. «Estou mais que satisfeito. Eu estava convencido que o projeto iria funcionar, por causa dos frutos que já tinha observado nos países em que já existia», explica o sacerdote, que adianta que este projeto permitiu trabalhar a «centralidade da Eucaristia» dentro das famílias.

Cristina Sá Carvalho, diretora do departamento de catequese do SNEC (Secretariado Nacional da Educação Cristã), órgão que abraçou este projeto desde o início, faz um balanço semelhante. «Do ponto de vista dos resultados, penso que foi muito positivo e começou logo a sê-lo», diz esta responsável, que adianta que as taxas de desistência dos pais que iniciaram o projeto foi extremamente baixa. «Quase não houve desistências nos grupos das paróquias-piloto durante os três anos, e aquilo que era a vivência e a experiência deles também começou logo a ser muito positiva desde o início. Os pais perceberam que era muito valioso para a sua vida familiar», diz a diretora do SNEC.

A catequese familiar segue os mesmos guias e conteúdos que a catequese “normal” das paróquias, pelo que as grandes mudanças que este projeto traz não são ao nível dos conteúdos, mas sim da vivência e da motivação. «A catequese familiar permite uma maior vivência da fé em família. Nós propomos poucas coisas para a família fazer, mas essas pequenas coisas permitem desenvolver essa vivência. Depois há o maior envolvimento da família toda na vida da comunidade», diz o Pe. Vasco. Cristina Sá Carvalho concorda, e acrescenta a questão da «evangelização mútua» de pais e filhos. «Há uma vivência de globalidade da experiência de fé que é muito forte, que origina uma evangelização mútua entre pais e filhos. Nestas famílias, o Espírito sopra com muita força», considera esta responsável.

O reforço dessa relação familiar foi uma das coisas que o André e a Ana, pais que participaram no projeto na diocese de Viana do Castelo, sentiram na sua relação com o Tiago, o filho que fez há pouco tempo a sua Primeira Comunhão. «Ao início foi um choque. “O quê, agora termos de voltar para a catequese? Para quê?”, comentávamos nós, mas depois foi um crescer muito giro, entre o grupo de pais e entre nós e o Tiago, porque eu e o André já tínhamos uma forma de comunicar a nossa fé entre nós, mas com o nosso filho não havia, e isto ajudou-nos imenso», diz esta mãe, que revela que o próprio filho se tornou exigente para com eles. «Há pouco tempo disse-nos que se não o levarmos à Missa a comungar, que nós é que ficamos em pecado, porque ele é apenas uma criança», conta, entre risos.
Da esquerda para a direita: o Pe. Vasco Gonçalves, Pedro Ruivo
e a família André, Ana e o filho Tiago
O pai André fala em maior motivação. «Quando eu andava na catequese, uns anos era por prazer, mas outros por obrigação, dependia do catequista. Mas este projeto ajudou-nos a sermos exemplo, e sabemos que se formos exemplo quem vem atrás tem sempre mais motivação para agir. Se os pais forem à catequese, os filhos também se vão motivar para ir», considera.
Como resultado desta maior motivação, ganhou também a comunidade e o resto do grupo de catequese dos pais que não aderiram à catequese familiar. «Os nossos convívios de final de ano da catequese são históricos, juntam imensa gente, e tal só é possível porque a iniciativa parte do grupo dos pais da catequese familiar, que depois abrem o convite a todos os pais e crianças», explica André Esteves.

Parte deste mérito está nos animadores familiares, os catequistas que asseguram a formação dos pais. Pedro Ruivo, de 43 anos, já tinha sido catequista de adolescentes, mas estava meio afastado. Até que a filha mais nova entrou para a catequese há três anos e o pároco o convidou a fazer parte do projeto de catequese familiar, não só como pai, mas como animador familiar. «É totalmente diferente de ser catequista de adolescentes, isso é certo», afirma, explicando que «são pais, têm alguma experiência, colocam outras questões. Era uma novidade, mas os pais já tinham algum caminho feito, pelo menos a maioria, embora os que andavam mais afastados tenham sido belas surpresas.»
Os encontros dos pais eram quinzenais, e pontualmente havia encontros entre o grupo dos pais e o grupo de catequese das crianças. Mas são muitas as possibilidades de organizar este projeto, e por isso o SNEC não limita as paróquias, antes acompanha-as no modelo que cada paróquia define, dentro das várias propostas existentes.

O ponto alto destes três anos foi, claro, a festa da Primeira Comunhão, que marcou o final desta caminhada que estava projetada para três anos. «A Primeira Comunhão foi um momento muito especial, e os pais tomaram consciência da importância desta celebração em virtude do trabalho que foi sendo feito durante estes três anos», argumenta Pedro Ruivo.
O trabalho feito com os pais foi tal que os pais se entusiasmaram e tomaram parte ativa na preparação da festa dos filhos. «Os pais viveram por dentro a preparação em si da cerimónia. O grupo coral foi substituído pelos pais, que animaram a celebração, todos participaram e viram o porquê das coisas, e foi um sabor diferente que teve esta comunhão, porque foi preparada por todos», recorda o animador familiar.

Apesar de funcionar apenas para os três primeiros anos de catequese, o SNEC decidiu avançar com mais três anos, até ao 6.º volume de catequese. Foi um pedido dos pais que veio confirmar uma intuição de Cristina Sá Carvalho. «Já tinha esta ideia desde o princípio. Nas paróquias-piloto os pais disseram logo que queriam acompanhar até ao fim, ou seja, os 6 anos», afirma.

Os bons resultados levam este jornalista a colocar a pergunta óbvia: Poderá a catequese familiar substituir por completo a catequese de infância a que estamos habituados? Enquanto Cristina Sá Carvalho tem algumas preocupações com o assunto, o Pe. Vasco não tem grandes dúvidas que sim. «A meu ver, o grande objetivo é que os três primeiros anos sejam de catequese familiar em todo o lado. É uma altura em que os pais acompanham de perto os filhos e é a grande oportunidade de evangelização dos pais», considera. A diretora do departamento de catequese do SNEC defende que deve haver uma complementaridade, até porque alguns pais, pelo menos numa fase inicial, «não aceitarão integrar os projetos». Nas paróquias que assumem por completo a catequese familiar, esses pais são dirigidos para paróquias vizinhas que não têm esse projeto, mas o Pe. Vasco acredita que, com o tempo, todas as paróquias passarão a ter estes projetos e eles serão tão naturais que todos os pais irão aderir, à semelhança do que sucede já no Chile, por exemplo.

Outro problema é o dos catequistas. Além de haver falta de catequistas para a catequese “normal” em algumas das grandes dioceses, esta necessidade de recrutamento é ainda mais específica, porque compreende o trabalho com adultos. Mas Cristina Sá Carvalho acredita que, com o aumento dos grupos de catequese familiar, irá aumentar também o campo de recrutamento de catequistas e outros agentes pastorais para as paróquias, pelo que o tempo é de avançar e trilhar caminho, e não de ficar com receio de perder esta ou aquela família em virtude de pais que demonstram menos interesse na educação cristã do seu filho.


Ricardo Perna


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