30 de setembro de 2015

Segundas uniões são «um assunto que precisa de ser estudado à luz dessa [dos dias de hoje] realidade»


D. Joseph Coutts, presidente da Conferência Episcopal do Paquistão, esteve no primeiro Sínodo, o ano passado, mas não estará neste, em virtude terem escolhido outros participantes para enviar como representantes do seu país, na vontade de «dar lugar a bispos mais novos», referiu o prelado. Mas isso não o impede de ter a sua opinião sobre alguns dos assuntos que vão estar em cima da mesa no Sínodo que se inicia no próximo dia 4.


Quais são os assuntos mais importantes que o Paquistão quer levar ao Sínodo de outubro?
A coisa boa é que o processo todo dos sínodos permite a participação de todos os países. Assim, se as nossas questões não forem abordadas, o problema não está no sínodo, está connosco, a falha será nossa. Divórcio e recasamento é um problema para nós, mas de uma forma diferente da Europa. Num país como o Paquistão, onde a taxa de literacia é pouco acima de 50%, os cristãos estão organizados, mas aparecem sempre uma série de pastores evangelistas que criam igrejas próprias com nomes muito bonitos, e isso confunde os cristãos que não têm formação.
Depois, o nosso governo reconhece o casamento religioso como válido, não é preciso casamento civil. Portanto, se um cristão quiser deixar a sua mulher, é possível que possam mudar-se apenas de cidade, pagar algum dinheiro a um destes pastores, que celebra o casamento sem saber que outro casamento já existe, e tudo fica legalizado. Sei que aqui isso não acontece, mas para nós é algo que sucede muito.

E, na sua opinião, as segundas uniões não são possíveis dentro da Igreja Católica? 
O processo, mesmo que o casamento tenha falhado e haja bom motivo para o anular, é tão longo que se encontram atalhos. Isto é uma teologia que ainda não desenvolvemos. Nós pomos as coisas do casamento num pedestal ideal que exige fidelidade até ao fim, e nem sempre é possível ao ser humano viver segundo esse ideal para sempre. O mesmo acontece no celibato dos sacerdotes. Mas aí é possível pedir dispensa do celibato, mas é mais difícil conseguir a anulação de um casamento. Há outras igrejas cristãs, como os ortodoxos, que têm outras práticas, pelo que penso que é um assunto que precisa de ser estudado à luz dessa realidade. Entretanto, o ponto que o Papa fala é o da misericórdia. Cristo representa o amor e a misericórdia de Deus, não apenas o cumprimento de leis que temos de obedecer.

As pessoas precisam de uma aproximação mais misericordiosa? 
Sim, precisam. Mas como vamos fazê-lo, sem tornar isto uma regra? É por isso que o Sínodo será muito duro. No final, espero que estas questões tenham resposta, embora saiba que não será fácil. Até porque estas questões vão levantar alguma fricção, como fez Jesus no seu tempo, quando perdoou as pessoas ou se sentou com pecadores.

Alguns dos participantes queixaram-se que as suas necessidades foram deixadas de lado no Sínodo ou na comunicação social, pelo menos.
Acho que isso aconteceu, de alguma forma. Mas os problemas do Mundo Ocidental são muito diferentes dos nossos. A poligamia em África é um deles. Podem ter uma família grande, que vive feliz numa grande casa, e depois temos de dizer ao chefe tribal que quer ser batizado que ele tem de mandar para casa 3 das 4 mulheres que tem. De acordo com a cultura deles, isso não era problema, e agora temos de dividir a família, e isso abriu-nos os olhos. Nos países asiáticos e em alguns africanos há a ideia de que a homossexualidade e o casamento é algo que não pode existir. Não é comum para nós, mas isso é diferente de aceitar pessoas que são homossexuais. Mas usar o termo casamento para nós também não é aceitável de todo.

Teme algum Cisma na Igreja por causa disto? 
Não creio. Depois do Vaticano II, as mudanças começaram a chegar e nós tínhamos um cardeal cuja lema era “sem mudança”, mas mesmo ele acabou por ir mudando. Haverá tensões, mas não vejo em que possa resultar dali uma divisão séria.
Temos de estudar bem os assuntos e saber bem o que queremos, porque não podemos dar a impressão de que estamos simplesmente a deitar à rua tradições que estão aqui há milhares de anos, mas sim olhar para elas sob uma nova luz, uma luz mais abrangente e, se essa luz sugerir mudanças, então elas devem ser feitas.

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